conversas à toa

não sei o quanto já disse isso por aqui, mas sou crédula de uma forma um tanto incomum. nasci em uma família católica não praticante, com pai quase-padre, mãe quase-mãe-de-santo e avós supersticiosas. nunca fomos levados a acreditar em nada mas ao mesmo tempo sinto que me fizeram acreditar em um pouco de tudo. a única coisa que realmente não faz sentido pra mim é um deus naquele formato velhinho de barbas ou entidade superior à nossa imagem e semelhança 🙂 de resto, acho que acredito e duvido de tudo.

acho bonito ter fé. não acho graça e nem faço pouco de quem de fato acredita em coisas que não são prováveis ou que não têm grande embasamento racional. acho bonito, admiro e invejo, essa é a verdade: como deve ser bom simplesmente acreditar! desde os meus 10 anos ou menos sinto uma angustiazinha constante a respeito da fé. o problema é que ela é angustiazinha — fosse uma angústia gigante eu já teria resolvido, acho. mas ela é pequena e eu consigo deixá-la de lado sempre que necessário. isso não significa que ela desaparece, não, ela fica ali incomodando como unha quebrada, como disse clarice lispector em algum dos seus livros. sinto falta da fé.

contei que graças à morte do meu pequenino pixel alguma coisa aconteceu e simplesmente passei a acreditar que sim, ele está em algum lugar, que está feliz. sonhei há muito tempo que morria e encontrava o pastel (meu outro furão que morreu em 2002) e seus amigos. o pixel, embora vivo, tinha me seguindo lá no reino dos mortos, que era aliás um lugar bonito e tranquilo. o único inconveniente é que não conseguia avisar aos que sentiam a minha falta que eu estava bem e feliz com meus furões. foi um sonho estranho e bom do qual não me esqueço nunca. é claro que posso fazer leituras psicanalíticas do meu sonho, mas da mesma forma que sabemos que está frio e não calor eu sei que o pixel e o pastel estão brincando naquele mundo bom.

mas quando comecei a falar de ser crédula não era exatamente de religião que eu queria falar mas de fé nas pessoas — essa eu tinha e perdi. o mundo me incomoda, de uma forma bem generalizada. as pessoas são burras, mesquinhas, egoístas. a pessoa comum não se enxerga, culpa o mundo por tudo o que dá errado na sua vida, acredita que o problema é sempre do outro. essas pessoas não conseguem pensar e criar, elas só repetem idéias prontas. fico cansada e triste quando converso com esse tipo de pessoa (e elas são muitas, são a maioria), me dá um desânimo… e olhem: eu não falo de coisas como “ninguém lê” ou que falta cultura geral. não tou nem aí se alguém não leu erico veríssimo ou se não viu os filmes do woody allen, sinceramente. isso pra mim é perfumaria, é bônus. o que me incomoda é falta de vida, experiência, reflexão, análise crítica, opinião, dúvida. as pessoas não duvidam mais, principalmente de si mesmas. e quanto mais informação a pessoa tem, pior fica, porque ela se veste de um poder que não tem, se convence que é melhor que as demais e fica mentalmente preguiçosa, indolente. lê uma opinião do umberto eco e adota pra si ao invés de dialogar com ele.

as pessoas perderam a capacidade do diálogo. é tão raro conversar com alguém e conseguir oferecer e receber! pode substituir por “falar e ouvir”, mas cuidado: o que mais vejo é gente que finge que ouve o outro mas no fundo só ouve a si próprio; o que o outro diz só serve como base para se provar ou usar como arma em argumentação. às vezes penso que ninguém mais quer pensar, o importante é vomitar informação e se impor. qual é a graça disso, meu deus?

há poucos dias uma amiga me confidenciou que se sente um pouco sozinha em relação aos amigos, que não consegue conversar com eles sobre opiniões, coisas interessantes, que eles não a fazem pensar. meu primeiro impulso foi pensar que ela escolheu mal seus amigos, mas, pensando bem, nem todos os amigos têm que nos fazer pensar, certo? certo, mas seria bom se uma boa parte deles fizesse. seria bom poder bater papo no ônibus e encontrar alguém interessante, seria bom poder conversar de verdade com colegas de trabalho. seria bom não ter essa sensação incômoda de solidão, de falar sozinho apesar de ter tanta gente falando numa mesa de bar.

quando foi que as pessoas pararam de se comunicar, a despeito da internet, TV, rádio, convívio social?

0 comments to “conversas à toa”
0 comments to “conversas à toa”

Deixe um comentário