incômodos x valores

assisti borat ontem (finalmente, felipe! obrigada pelo presente :)) e foi uma experiência forte, que o cinema já não me provocava há muitos anos.

o filme é absurdo, engraçado e principalmente incômodo. o sentimento de vergonha alheia ultrapassa todos os limites até então alcançados e vai além. não sei se fiquei mais incomodada com o protagonista ou com as pessoas envolvidas no filme. é páreo duro, considerando que ele é um personagem e as pessoas são elas mesmas.

mas além da vergonha alheia nas situações constragedoras, o que mais senti foi indignação. os americanos do filme (pessoas reais!) são absurdos de tão idiotas. como bem resumiu o fer, a única que salva no documentário é a puta, a única pessoa decente e que dá vontade de conhecer melhor. os demais são lixo humano da pior categoria, a gente suspira de alívio quando a cena acaba.

a coisa que mais me incomodou no documentário todo é a seqüência do jantar “elegante”, durante o qual o protagonista dá um show de falta de noção e as pessoas não só suportam mas comentam, durante a ausência dele, que “com pouco tempo no país já seria possível americanizá-lo”. o discurso da anfitriã se mantém mesmo depois de receber, na mesa de jantar, um saquinho cheio de merda. parece não haver limites para o discurso politicamente correto e “vamos respeitar as diferenças”, até que entra em cena a convidada do borat, uma puta de beira de estrada. aí a gente vê um americano subir nas tamancas… expulsaram os dois da casa, depois do cocô no saquinho e as afirmações absurdas não terem conseguido provocar nenhum tipo de indignação.

o filme expõe como o politicamente correto e os relativismos são ridículos e incoerentes. os “entrevistados” são escrotos, preconceituosos e sem noção quando expõem o que realmente pensam, mas ao mesmo tempo aceitam como gado a violação dos seus próprios costumes e valores. há uma cena surreal de uma mulher vendo “fotos de família”: as fotos do protagonista com seu “primo” mostram closes do pau do dito cujo com um borat sorridente ao lado; a senhora, obviamente incomodada, não tem coragem de dizer que aquilo a incomoda e não quer ver pau de primo porra nenhuma. ela se limita a explicar, como uma gravação, que “aquele tipo de foto não é apropriada” e continua vendo as fotos, educadamente. bando de idiotas hipócritas!

várias vezes durante o filme eu pensei em desistir, juro. fechei os olhos e os ouvidos (mesmo, com as mãos) várias vezes, tamanho foi meu incômodo com as cenas. e não é por pudor ou nojo das escatologias ou piadas preconceituosas, não; é porque senti a mais pura vergonha por aqueles americanos, que estavam ali muito mais expostos que o produtor e o protagonista lutando pelados pelos corredores do hotel. a bunda gorda e peluda do produtor me incomodou muito menos que os participantes do filme.

**

a última vez que fiquei tão incomodada com um filme foi em 1998 assistindo she’s so lovely. o filme conta a história de uma mulher que abandona seus filhos, casa e um casamento razoável para voltar a viver com um maníaco drogado.

ao final do filme saí indignada, achando uma merda com m maiúsculo. ruminei o maldito filme por 1 semana e concluí, com certo amargor, que ele era do caralho justamente porque incomodou. não havia motivo técnico para desgostar, era puro conflito de idéias, ou melhor, de ideais. ele me que fez todo esse efeito interno justamente porque eu estava (e estou!) amarrada a certos valores e preconceitos que fui obrigada a encarar. o filme não me fez mudar de opinião, valores ou preconceitos, mas jogou luz sobre essas coisas que estavam escondidas.

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  1. ah, sim, complementando: lendo as opiniões de americanos no IMDB fiquei ainda mais passada. muitos acham engraçado, mas atribuem as barbaridades faladas no filme pelos americanos como “coisa dos estados menos evoluídos”. como se os estados unidos DE VERDADE não fossem assim, sabe como? iúc.

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