estou pra escrever esse post há séculos, o assunto passa pela minha cabeça pelo menos uma vez por dia e venho adiando conscientemente, porque é pedreira. não que esse blog ainda tenha a quantidade imensa de leitores que tinha há 7 anos, mas sei que vem muita gente aqui, e diferente de eu-há-7-anos a minha versão 4.0 não é chegada em polêmica.
mas não nego — fiquei ainda mais fiel ao dito popular “dou um boi pra não entrar numa briga e uma boiada pra não sair”. e essa briga aqui eu faço questão de entrar.
sou atéia e evolucionista de carteirinha. acho a psicologia evolucionista muito interessante, pois ela parte de premissas nas quais eu acredito, mas não sei dizer se a prática (em formato de terapia) é efetiva, nunca vi aplicada. na minha opinião e prática (como paciente) a forma como a terapia é conduzida (técnica) é essencial para atingir o objetivo de ajudar o paciente.
e a propósito, discordo da afirmação da wiki de que existem ateus “espiritualistas”. isso não faz sentido algum pra mim. se você tem dúvidas, e acha que talvez exista algum tipo de deus ou divindade ou entidade metafísica, está mais para agnóstico. nego a existência de qualquer deus, entidade, alma, espírito, vida além da morte. respeito quem acredita, na medida em que a crença não interfira na convivência social e não seja intrusiva. e não me incomodaria em absoluto se amanhã houvesse comprovação de que tais coisas existem. isso não é uma competição, afinal. trata-se de visão do mundo — acredito na ciência, naquilo que pode ser comprovado. o restante todo é simplesmente desconhecido, e o desconhecido não me incomoda. é só questão de tempo.
já li algumas vezes pessoas repetindo um bordão que é uma bobagem sem tamanho, algo como “a fé dos ateus”. a fé pressupõe falta de prova e critério, exatamente o inverso do modo de ver o mundo dos ateus. não é que eu acredite na teoria da evolução, ela foi comprovada cientificamente! é pra isso que serve o método científico, sem o qual falamos apenas de hipóteses e, sim, fé. é por isso que insisto que não acredito em homeopatia mais do que acredito em placebo — não há nenhuma evidência científica, usando nenhum método, que comprove que a 1a é mais eficaz que a 2a. sendo assim, prefiro usar a opção que é GRÁTIS 😀
mas não é disso que quero falar, vamos entrar no assunto de verdade: a psicologia evolutiva e a comprovação científica de que gênero — e os hormônios predominantes de cada um — modificam e direcionam comportamento.
eu mesma, que sou só curiosa e 100% leiga, já vi dezenas de artigos e documentários mostrando o quanto o genêro (e a concentração de hormônios-chave de cada gênero) é determinante no padrão comportamental e no impulso. são estudos exaustivos, com pessoas de diferentes idades, culturas, gêneros, nível cultural e educacional. todos apontam os mesmos resultados — a concentração de determinamos hormônios nos direciona para determinados comportamentos e ações.
fiz questão de enfatizar o “direciona”, porque um dos grandes equívocos de interpretação que vejo por aí da teoria e psicologia evolutiva é que estes impulsos ou pré-disposições são tudo que existe, e o fato de sermos “programados” para determinados comportamentos nos torna escravos dos nossos impulsos e hormônios.
há um documentário interessantíssimo (cujo nome obviamente esqueci) que fez um estudo com homens e mulheres, avaliando os mesmos aspectos nos gêneros porém considerando a concentração de hormônios (masculinos e femininos) presentes em ambos os sexos como fator determinante. procuraram montar um gradiente completo — mulheres com maior concentração de hormônios masculinos e homens com maior concentração de hormônios femininos (e uma variedade de combinações aí entre os extremos).
o que vocês acham que aconteceu neste estudo? exatamente o esperado: dadas tarefas específicas para todos de forma idêntica, os resultados em função da concentração de hormônios são absolutamente previsíveis e foram confirmados. um dos exemplos curiosos: a mulher com maior concentração de testosterona se saiu melhor utilizando pela 1a vez um trator daqueles de “pinçar” coisas que os homens com níveis de testosterona menores. homens são de fato mais eficientes em atividades que demandam localização espacial, mas ela, com seu nível de testosterona mais alto, se saiu tão bem ou melhor que vários homens. nenhum deles jamais tinha usado equipamento parecido na vida, receberam as mesmas instruções.
bom, e pra quem não acredita em estudos científicos, mesmo que exaustivamente provados, faço o seguinte alerta — lembre que seres humanos são animais como quaisquer outros. todos eles são sujeitos à evolução, e são pré-programados para serem bem-sucedidos evolutivamente. muitos deles são também sociais, se comunicam. somos apenas mais uma espécie. não somos menos animais simplesmente porque somos mais numerosos, porque dominamos nosso meio-ambiente ou porque somos os únicos conscientes de nós mesmos (como saber se não há outras formas de vida conscientes também, aliás?). as leis da natureza e da ciência que se aplicam pra eles, se aplicam também pra nós.
mas seguindo: por mais que nosso gênero e “programação genética” nos levem a determinados comportamentos, tenho absoluta certeza que fatores culturais e sociais são também importantes e modificam nosso impulso. os impulsos pré-programados não são “desculpa” para comportamentos considerados inadequados, afinal vários de nós controlam tais impulsos. baseado em tudo que li na vida, na ciência, vejo o “homem comum” programado para procurar quantas parceiras ele puder encontrar e procriar — ele vai ter esse desejo, é inevitável. entre o desejo e a ação, no entanto, está tudo aquilo nos faz humanos, e essa esfera é infinita, complexa e objeto de toda a ciência social, filosofia e psicologia. é provavelmente o que nos diferencia dos nossos antepassados evolutivamente falando.
ora, quem leu o gene egoísta — o supra sumo do assunto — deve lembrar que mesmo o radical dawkins deixa bem claro que a “escravidão” dos genes não é desculpa para comportamentos socialmente inadequados. somos também animais sociais — e vejam quão maquiavélico é o mecanismo evolutivo: se não nos adequamos ao grupo do qual fazemos parte, apresentando comportamentos socialmente aceitáveis e admiráveis, nossa chance evolutiva diminui bastante. mesmo do ponto de vista comportamental (em contraposição à genética), a evolução se faz presente e é implacável. sobrevivem e se perpetuam aqueles que são mais aptos inclusive do ponto de vista comportamental. e quanto mais sofisticada a sociedade, mais importante se torna o comportamento, e menos importante a programação genética. é tudo parte do mecanismo evolutivo — procriam e prosperam os mais adaptados.
yes, science is a bitch 😉
Ah, Zel, nem achei tão polêmico assim, vai. Bem bacana, com referências interessantes. Ah e adorei o post anterior em que você fala da tua mãe, mexeu tanto comigo que eu nem consegui comentar lá, há há. Foi um exemplo forte que te marcou mas não te sufocou, gostei disso. =)
Mariana, talvez pra você não seja polêmico, mas acredite — pra muita gente é um PROBLEMÃO admitir (aceitar, talvez) que somos pré-programados, que nosso comportamento é também dirigido pelo nosso gênero e pela química.
Sobre minha mãe, já leu um post que escrevi no Fabricando a respeito de feedback para crianças? Lá você vai ver outro aspecto da minha mãe, não tão legal assim 😀
Beijo, querida!
Eu também não achei polêmico não. Achei bem interessante, aliás. E eu sou uma dessas pessoas que acredita (ainda) em Deus e na fé. Mas eu acredito mais ainda na liberdade de cada um acreditar (ou não) no que quiser.
poxa, que bom! \o/ será que meus 4.0 me fizeram escrever de um jeito menos polêmico sobre esse assunto cabeludo? 🙂 beijo!
Eu acredito em Deus e na teoria evolucionista e amei esse post.
Ñão que eu já não soubesse eheh 😛 mas lendo confirmei, sou ainda meio primitiva em sociabiliade e por isso vivo me ferrando, tenho tentado melhoras mas algumas vezes os hormônios, a predisposição genética ou qualquer referência atávica predominam e depois, lá vem o arrependimento.
Mto a evoluir ainda
Amei o post Zel 🙂
Bjos
Poxa, voltou super bem.
Texto muito bom, adoro ler algo para poder refletir.
Zel, faz tempo que não venho comentar e li o título “silence is a bitch”. Li tudo, e já estava pensando em “ah, ela quis dizer “science”, que engraçado” voltei lá no título e quem leu errado fui eu.
Olha o meu inconsciente me mandando mensagens bem concretas.
Nada a ver com o assunto, mas quis compartilhar o meu momento sem noção
hahhahahaha, “silence” can also be a bitch 🙂