encontros
andava apressado sem saber porquê, era assim mesmo que se andava ali. gente, tropeço, encontrão, ninguém olhando no olho. muitas caras de poucos amigos. pára na calçada, espera, civilizadamente, o sinal fechar. carros, buzinas, bicicletas, ansiedade coletiva e o sinal fecha, ele vai distraído até vê-la.
ela vinha, tranqüila. gente de todo tipo de todos os lados, pouco espaço, mas ela gosta, presta atenção e olha como quem se alimenta. eles olham de volta, e sentem algo que não se define, mistura de prazer com incômodo: ela olha nos olhos. olhares nos olhos são mais pessoais que abraços ou beijos, são arrebatadores. ela, parada esperando o sinal avermelhar, observa, e o vê. ele está distraído, impaciente, pisa como um cavalo novo, os cabelos bagunçados brilhando no sol. ele não a vê, ele não vê nada. ela olha mais, e ele, quando o sinal fica verde, caminha um passo, e encontra os olhos dela.
ele não pára pois não pensa; ela não pára porque sabe onde vai: no meio da multidão, vai até ele com passos decididos (aqueles cabelos, a boca entreaberta de quem vai falar e esqueceu, ah). quase no meio da rua ela o encontra, suas mãos não hesitam e tocam o rosto dele, os dedos nos cabelos, escorregam, ela o beija. não um beijo qualquer, um beijo de fome, beijo de mulher. ele se entrega, bêbado de surpresa, esquece a rua, a vida, só existe ela, e as mãos. ela sorri, e diz, no seu ouvido: “se eu fosse só, você seria meu.”, e se vai, sem olhar pra trás. os carros, a rua, o mundo todo ao redor pára e ela anda, seus pés criando o mundo a cada passo.
ela se vai, e para todos ao redor, tudo pareceu sonho. mas não para ele. ele descobre, feliz, que ela o acordou para esse mundo mágico das mulheres, o mundo do desejo.