fabricando

a educação para o mundo

February 14, 2012 · 10 Comments

desde sempre ouvi por aí que “devemos educar nossos filhos para o mundo”. como me parece simplesmente bom senso, assumi que todos os pais se preocupariam com isso e, ora, educariam seus filhos “para o mundo”. talvez o óbvio e o bom senso não sejam tão óbvios assim, porque o tempo todo me deparo com pais excessivamente permissivos (ou ausentes, ou ambos ao mesmo tempo!) e filhos totalmente despreparados “para o mundo”. não, é pior do que despreparados, eles são péssimos contribuidores para um mundo já caótico, com recursos escassos e cheio demais.

a mim parece claro que vivendo num mundo com essas caraterísticas — superpopulado e com recursos escasseando — devíamos nos preocupar em cultivar e ensinar a gentileza, o cuidado com o excesso, o aprendizado do respeito pela natureza e pelo próximo, a paciência para lidar com as inúmeras frustrações que teremos pela frente, cada vez mais.

o que se vê pela rua, pela vida, aos montes, é o inverso: pessoas rudes (e nas redes sociais ainda mais, protegidos atrás dos seus teclados), desperdício, condescendência com a falta de educação, indulgência e a muleta do “isso não é problema meu”.

no que diz respeito à educação de crianças, como disse em outro post, o que realmente me choca não é crianças serem crianças e testarem os limites dos adultos, mas os adultos permitirem sem dizer NÃO. crianças gritam e fazem bagunça em locais que não são sua casa, desrespeitam ordens diretas e os pais não dizem não! às vezes simplesmente se omitem (porque de fato CANSA dizer a mesma coisa o dia todo) ou inventam desculpas para a falta de disciplina (“ela é muito agitada, sabe?” ou “ele tem muita energia!”).

disciplina é uma habilidade essencial para absolutamente tudo na vida. por mais que se escolha não ser disciplinado em qualquer momento, é preciso que essa habilidade seja ENSINADA. se alguém quiser optar por ser indisciplinado de forma consciente, que arque com as consequências (e isso também precisa ser ensinado).

que bem para o seu filho e para o mundo estará fazendo o pai/mãe que se exime de ensinar disciplina, respeito pelo espaço do outro e que sempre haverá consequências para a falta de respeito, a desorganização, a grosseria?

gostei muito deste artigo que compara mães francesas às mães americanas, justamente porque fala sobre ensinar paciência, disciplina, respeito, com muita firmeza. dentro dos limites (que são frequentemente aqueles estabelecidos pelos outros seres humanos ao redor), podemos ser livres. ser livre, criativo e “energético”, não é sinônimo de ser inconveniente e cheio de vontades à revelia dos demais.

brasileiros (latinos, talvez?) são ainda mais permissivos que americanos com suas crianças. vivemos na ditadura dos pequenos, temos que nos submeter à vontade deles e aos seus comportamentos inconvenientes porque “são crianças”, afinal?

não creio que esse seja o melhor caminho. talvez seja o mais simples, o que dá menos trabalho. ou que nos faça sentir menos culpados, já que passamos boa parte do dia longe dos nossos filhos e queremos compensar.

quando me bate a preguiça ou a culpa quando preciso ser firme com meu filho (e sei que ele vai ficar triste), penso que estou ajudando sua versão futura a ser mais sociável e feliz, que ele sofrerá menos com as frustrações muitas que certamente virão, vivendo neste mundo cheio de gente e dificuldades.

não sou mãe francesa, eu sei, mas vou me esforçar muito pra ser cada vez mais. com firmeza e muito amor.

Categories: educação · maternidade

10 responses so far ↓

  • Raquel_NY // February 14, 2012 at 12:55 pm |

    Eu comprei o livro e li em dois dias. Tem um pouco de “americacentrismo” demais para o meu gosto e se ve que ela quer mais e vender livros, mas ha algumas coisas bem interessantes que se pode aproveitar. Segundo ela, os franceses acreditam que as criancas sao seres racionais e que compreendem as coisas desde sempre, portanto tudo o que fazem com os bebes e explicado (ao contrario de ser constantemente “narrado” de maneira irritante, como por aqui) e os pais acreditam firmemente que os bebes estao entendendo e assimilando as explicacoes e vao comecar a responder a elas de forma racional quando o momento chegar. Outra coisa legal e a insistencia em coisas corriqueiras mas importantes, como fazer com que a crianca sempre de “bonjour” e se despeca dos adultos quando chegam e saem de um determinado ambiente. Para os franceses esse e um instrumento de afirmacao da identidade separada da crianca e um momento em que ela esta em pe de igualdade com o adulto, o que ajuda o desenvolvimento da auto-estima e possibilita a convivencia entre pessoas de idades variadas. Fiquei muito impressionada com a descricao do sistema publico de daycare (tanto a creche quanto a ecole maternelle), gratuito e de qualidade, que permite as maes voltarem ao trabalho com a certeza de que seus filhos estao em boas maos. Infelizmente essa realidade esta ao alcance de muito poucos.
    A ultima coisa que me chamou a atencao e que, ao contrario daqui dos EUA, onde uma das minhas colegas de escritorio ja colocou o filho de 2 anos em aulas de mandarim, judo e musicalidade, os franceses acreditam que a primeira infancia e um periodo para a crianca ter toda a liberdade para descobrir a realidade a sua volta e brincar sem muita interferencia dos adutos. Enfim, desfrutar. Achei bem libertador :o)

  • Mariangela // February 15, 2012 at 7:11 am |

    Zel, uma das coisas que mais me chamou a atenção quando cheguei a Espanha foi a atitude da escola com relação ao comportamento das crianças.Te confesso que fiquei meio pasma pois aqui professores e “tutores” fazem algumas coisas que no Brasil seriam impensáveis.No Brasil lembro de pais de alunos da sala de minha filha(escola particular de elite em Porto Alegre) se unirem para despedirem professores.Não entro no mérito da questão pois são histórias longas mas tem tudo a ver com o que tu colocas em teu texto,sobre falta de limites e de educação dos nossos filhos e suas consequencias.Vejo todos permissivos demais aí no Brasil,e me pergunto o por que.
    Na escola de minha filha aqui,por exemplo, muitos almoçam no “comedor” diariamente. Os pais recebem as regras do comedor,e entre algumas,”todas as crianças estão OBRIGADAS a provar tudo,e a comer ao menos metade do que é oferecido,para se acostumarem aos novos sabores e desenvolverem o paladar, sob supervisão do tutor “. Outro exemplo, estes dias dois guris ameaçaram brigar na saída da escola e a escola chamou a polícia,que estava na saída vigiando os portões, após, os pais foram chamados,pela escola e pela polícia.Te confesso que fico surpresa pois seriam atitudes impensáveis em escola particular do Brasil( a daqui também é) mas é mais ou menos o esquema do “se não recebe educação em casa, o meio,a escola se encarrega”.
    No Brasil vejo tudo muito velado,as escondidas, parece um pequeno complo de pais em torno do umbigo de seus filhos. Aqui vejo a escola mais incisiva,tipo, existem regras a seguir, e “escreveu não leu o pau comeu”.Ainda não sei se concordo em absoluto com este método que para nós é algo novo,bem diferente da permissividade brasileira.

    Enfim, educar não é tarefa fácil,e dá um trabalho animal, consome uma baita energia emocional e física,e penso que muitos não tem talento algum para a maternidade/paternidade.
    Aí, a vida vai se encarregar de moldar a criatura de qualquer jeito.
    Abraço para ti!!!

    • zel // February 15, 2012 at 8:30 am |

      Mari, já tou fã desse sistema educacional 🙂 Não é à toa que os europeus são EDUCADOS — o sistema se encarrega de colocar as pessoas no eixo. Não pode fazer tudo o que quer, de jeito nenhum, e o indivíduo NÃO É mais importante que a comunidade. Achei o máximo essas regras de alimentação, pois também se baseiam na escassez. Só quem já passou por guerras e fome sabe o quanto é importante comer de tudo, e não desperdiçar (diferente de nós, e dos americanos, que jogam milhões de quilos de comida fora todos os dias).

      Que bom que eles ainda mantêm essa rigidez. Gostaria de achar uma escola assim pro Otto 🙁

      • Mariangela // February 15, 2012 at 11:46 am |

        Zel, a verdade é que meu marido e eu estamos muito satisfeitos. Concordo com o que tu disseste,a vida acontece em comunidade e há que se respeitar regras de boa convivencia e educação.
        Nesta questão do comedor escolar,por exemplo, minha filha tem duas amigas na turma,uma do paquistão,e outra do Marrocos.A marroquina tem restrições alimentares de ordem religiosa e não pode comer carneiro,me parece, quando é assim, a escola respeita mas não prepara cardápio especial e ela deve consumir as outras ofertas do cardápio.Assim como crianças com problemas de saúde que impedem o consumo de certos alimentos devem apresentar uma entrevista com o médico para comprovar a situação.
        E a paquistanesa anda com a cabeça coberta, o que também é respeitado.Mas veja, a escola não oferece a disciplina Religião,como no Brasil(ufa! adorei esta parte hahaha) mas estes tempos fizeram uma excursão a um Mosteiro Medieval aqui na Catalunya e os pais não permitiram que a paquistanesa fizesse a viagem,por motivos religiosos .Neste caso a escola oferece algo alternativo ou que fique em casa.
        Quero dizer, convicções religiosas são toleradas e respeitadas mas te confesso que morri de pena da menina,que perdeu uma viagem muito interessante.
        De resto, penso que as multas/penalidades na Europa toda são sempre muito altas, por outro lado existe uma educação cívica muito forte nas escolas aqui(coisa que no Brasil NÃO EXISTE) no sentido de respeitar as regras sociais.
        Quando matriculamos e recebemos as regras do comedor da escola não conseguíamos parar de rir,passava a impressão que a tutora era uma daquelas senhoras velhas e magricelas com uma vara de marmelo na mão pronta para agir a qualquer momento haha!
        Sem contar que o povo aqui gosta muito de comer lesmas,estas mesmo de jardim, e nossa filha se apavorava só de pensar na possibilidade de receber um prato de lesmas e ter que comer sem reclamar hahaha.
        Beijos querida!!!

        • Mtanos // February 27, 2012 at 5:23 am |

          Eu ja ouvi uma serie de historias paecridas com essa. E um absurdo mesmo! Cade o coletivo, meu Deus??? O umbigo de certas pessoas tem se tornado do tamanho do mundo, e um absurdo….Bjos,Camilawww.mamaetaocupada.blogspot.com

  • Greicy Pantoja // February 15, 2012 at 9:39 pm |

    Zel,

    O quanto eu ouvi da minha mãe que ela estava me educando para o mundo, principalmente quando eu tinha que ouvir os nãos e os motivos dela para dizer não.
    Acho que além da linda Ilha Dodô você poderia um dia escrever um livro sobre a sua experiência como mãe e com os temas aqui do fabricando.

    Beijos,
    Greicy

  • Adriana // February 26, 2012 at 8:41 am |

    🙂
    Ivanise, concordo vc deveria escrever um livro mesmo vc toca em assuntos que eu adoro, e eu sou bem rígida com meus filhos, isso me alivia, pq as vezes agente se sente culpada …..parece que sufocamos eles ….muitas pessoas me elogiam, alguma falam deixe as cçs viverem, mas eu não mudo minha posição educação p mim é td …. eu sei que erro sim mas, to tentando me acertar ..lendo muito 🙂 , e estou aprendendo junto, temos que educar os filhos para o mundo sim, assino em baixo, mesmo que o mundo não se encaixe nesta educação que hj em dia, mas isso tudo reflete no mundo…acredito que as crianças de hj tem o poder de mudar o mundo no futuro temos que ter esperança, quero um mundo melhor para os meus filhos, mas tbm quero filhos melhores para esse mundo!!!
    É difícil mas temos que conseguir, por limites é tudo sem limites…. já viu!!

    bjss
    😉

  • Suellen // March 30, 2012 at 12:00 pm |

    Zel, concordando com os comentários aí de cima: você realmente deveria escrever um livro sobre a sua experiência como mãe, e também com as suas opiniões.
    Eu não pretendo ter filhos exatamente por isso: criar e educar uma pessoa para o mundo exige muita vontade e, principalmente, responsabilidade. Não quero botar no mundo os exemplares que vivo encontrando por aí. Uma criança mais mal educada que a outra, e pais ausentes e permissivos, olhando tudo como se fosse a coisa mais normal do mundo! Tenho um afilhado de 5 anos e um sobrinho de 8 meses, e sempre tento contribuir com a formação deles como pessoas, e suas dicas ajudam muito! Vivo encaminhando seus textos pra minha cunhada rsrs
    Beijo grande!

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