o menino já se comunicava com a gente antes de falar, é verdade. mas é muito mágico expressar-se verbalmente, além de ser muito interessante observar como revelamos nossa personalidade através da fala. estou lendo um livro muito interessante sobre o desenvolvimento neural de bebês e crianças (coloco link depois) que explica como a linguagem estruturada é uma característica da nossa espécie e que, salvo exceções, todos nós dominamos a linguagem em algum momento, pois nosso cérebro já vem preparado pra isso.
depois de mais ou menos 1 mês de iniciar o processo de falar, o otto ensaia conexões entre as palavras e o uso de palavras fora do contexto óbvio. essa mudança é espantosa, apesar de sutil.
pra quem nunca acompanhou o desenvolvimento da fala de um humano, eu explico o quanto é interessante esse processo: tudo começa com uso de palavras soltas, repetições de palavras que outras pessoas falam ou objetos/pessoas tangíveis, ou seja — tudo muito primitivo. mamã, água, au-au, pé. aos poucos se percebe a inserção de elementos mais subjetivos na fala, e a apropriação de verbos, mesmo que sem conexão com outras palavras. esse salto é incrível, pois a criança deixa de simplesmente repetir palavras ou verbalizar algo tangível e passa a expressar ideias próprias (“aúma” a bagunça), memórias (ouve uma música e lembra da “vovó vera”) e conceitos abstratos (“fuzí”, ameaçando sair correndo pra fugir da hora de dormir).
suponho que o próximo passo seja conectar o que é concreto com verbos, ideias, pessoas, e começar a formar frases complexas. ele começou a formar microfrases, em geral dando ordens (o imperativo definitivamente é o tempo verbal preferido dos bebês!): “aía, fêm!” (chamando com as mãozinhas)
já não consigo mais contar todas as palavras que ele fala, e nem me interessa a quantidade, pois agora finalmente é possível entender — através da expressão verbal, mesmo que truncada — os caminhos sinápticos do menino. agora é simplesmente uma questão de exercício fonético, estabelecimento de conexões e repertório.
o que me espanta neste momento é, diante da limitação do aprendizado tão ainda incipiente, a capacidade de flexionar verbos corretamente. ele ordena “apaga”, e quando apagamos, diz “apagou”; mas quando é ele quem apaga, diz “apaguei”. chega ao cúmulo de usar corretamente o verbo fazer. “otto, fez cocô?” e ele responde “fiz!”. outro dia vui a tia saindo de fininho (fugindo dele) e falou “fuzindo!”
não é que ele não erre as palavras, e confunda tudo (como achar que “eu” designa o outro, já que todos se referem a si mesmos como “eu”), mas muito frequentemente ele usa os verbos corretamente. mas confunde letras, e às vezes me parece que modifica certas palavras simplesmente porque acha legal — piábo, bocóli (ele já falou direitinho “quiabo” e “brócoli”).
a verdade é que é tão bonitinho ver as palavras sendo ditas do jeito todo especial daquele bebê que acabamos incentivando o erro, eu sei.
ele agora conta direitinho até quinze (mas sempre pula o DOZE), e está ensaiando mostrar os dedos quando conta. aprendeu algumas cores, mas não sabe o que é COR. ele pega o giz vermelho e diz “vemêlho”, “amarelo”, mas se perguntamos “que cor é essa?”, nos olha espantado com cara de ué, e pede o “maôm” pra rabiscar alguma coisa.
ele identifica as figuras geométricas mais simples (e que fazem parte dos brinquedos dele de encaixar), “tiângulo”, “qadádo” e “bola”. pede pra desenhar tudo: as figuras, “úa” e “estêla, estelinhaaaa”, vários bichos, e manda a gente fazer tudo. “aúma”, “ímpa”, “ábi”, “fecha”, “fêm”, “anda”, “cóe” (corre), etc.
2 responses so far ↓
Teca // July 12, 2012 at 2:42 pm |
Zel,
To passando por uma fase parecida, mas com letras escritas e lidas, como passei, encantada como você, quando Uli começou a falar. No fim, o que fiquei com vontade de dizer é que é maravilhoso repensar a linguagem, o pensamento, as associações junto com os pequenos. Lembrei de um texto do Ítalo Calvino em que ele diz que a poesia é a linguagem primeira, a mais elementar porque brincamos com as palavras, com todo o seu potencial, livremente, como uma criança. É uma brincadeira de invenção!
Que lindo é este momento! Beijos pra vocês três,
Teca
zel // July 13, 2012 at 11:20 am |
nossa, mas o uli já tá lendo/escrevendo? que adiantado! imagino que máximo é essa outra fase, de ver a criança aprendendo talvez as habilidades mais mágicas e importantes da civilização: leitura e escrita. emocionante 🙂 beijo, linda.
You must be logged in to post a comment.