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Quando a gente é humano demais

March 17, 2017 · Leave a Comment

Ter filhos é um aprendizado absurdo, não só sobre o mundo e a humanidade (cada humano único é a representação do todo, feito fractal, sabiam?) mas especialmente sobre a gente mesmo.
Eu sou filha mais velha, primeira neta de um lado da família, sempre prestaram muita atenção em mim desde que nasci e em especial nos primeiros 16 meses em que fui filha única. Todos sempre mencionaram que eu era uma criança com muitas características interessantes, geralmente positivas, mas minha mãe e pai que são mais honestos contaram que eu chorava MUITO. Mas muito mesmo, tipo de enlouquecer a pessoa. Meu apelido, “Gatão”, diz a lenda que era por causa do gato do meu pai que minha mãe expulsou do meu berço, mas também por causa dos meus berros, que pareciam de gato miando. Depois melhorou, e eu continuei uma criança voluntariosa (mimada? Cof cof) porém sociável e extrovertida.
Façamos um fast forward de 30 anos. Comecei a fazer terapia e prestar atenção em mim mesma, entender o que eu gostava ou desgostava, e percebi que eu:

– Tenho horror a barulhos altos, em especial aqueles “de fundo” (trânsito, muita gente falando ao mesmo tempo)

– Tenho aversão a cheiros fortes (me dá dor de cabeça e enjoo)

– Não gosto de comidas excessivamente temperadas / salgadas / adoçadas, e quando parei de comer essas coisas é que percebi o incômodo anterior

– Roupas e sapatos ásperos / apertados destroem meu humor, minha felicidade

– Luz excessiva me incomoda, dá dor de cabeça e deixa de péssimo humor
Sei que várias dessas coisas são comuns. Mas elas me incomodam MUITO, e eu só percebi depois que mudei algumas delas, observando como me sentia. Não são incômodos pequenos, são enormes. Minha vida mudou depois que saí de SP, pra um lugar mais silencioso, por exemplo, e quando aprendi a ficar mais em silêncio.
Sou o que alguns descrevem como “altamente sensível”. Minha percepção de algumas coisas é obviamente diferente da maioria que me cerca.
Mas nada disso que percebi por volta dos 30 “ligou” com minha infância, por onde comecei a história. Nunca me ocorreu que eu sempre havia sido assim, sensível, desde que nasci.
Aí o Otto nasceu, e foi minha 1a experiência cuidando de um bebê, e de outro ser humano. Eu não sabia o que fazer, mas as atividades “mecânicas” são simples, apesar de cansativas. Só que eu não estava preparada pra cuidar de um bebê que chorava loucamente das 18h às 23h, sem parar, e sem solução aparente.
Ele sempre teve o sono muito leve, dormia pouco, e acordava facilmente. Detestava tomar sol, mesmo de manhã. Detestava sling. Não gostava de ficar no peito a menos que estivesse com fome. A única coisa que acalmava era andar com ele, de preferência do lado de fora da casa, em meio às plantas.
(Por horas; sem parar)
E no horário em que as crianças ficam com sono e dormem (ao anoitecer) era um terror, todo dia, por meses. Era desesperador.
Ele cresceu e foi melhorando (de-va-gar), com 6 anos e meio ele dorme cedo, mas sempre acorda à noite (sem drama, só quer ficar junto). Mas o incômodo com barulho permaneceu. E agora já é possível observar coisas que me fizeram perceber algumas semelhanças comigo: incômodo com luz excessiva, e com barulhos altos (ele fica muito agitado e incomodado com muita gente falando ao mesmo tempo).
Ele também (como eu) é muito atento ao ambiente e fica agitado / sensível quando algo não vai bem ao redor, quando discutem ou falam alto. Só que eu aprendi a disfarçar e lidar, e ele ainda não. Ele presta atenção a tudo, a detalhes pequenos, e lembra deles muito tempo depois.
Conto essa história toda porque a maioria das pessoas NÃO é assim. Poucos são altamente sensíveis, e isso não é algo que se escolhe, está relacionado ao sistema nervoso central e como são “decodificados” os estímulos externos. Uma parcela pequena de nós (e uma parcela ainda menor é extrovertida, como eu) é assim, e não sabemos lidar com essas pessoas. Eu não sabia (mesmo sendo uma delas), porque sempre interpretei como sendo “frescura” (“ain, mas que chata você que não gosta de música alta!”). Nunca consegui ter uma experiência positiva usando drogas — a sensação que tive quando experimentei é de que meu cérebro ia explodir com tanto estímulo e meu corpo ficou tão sensível que era impossível até suportar a roupa, ou a textura de um sofá mais áspero. Foi sempre horrível e não repeti.
Bebês altamente sensíveis choram porque não conseguem lidar com o excesso de informação / estímulo fora do útero. Os cérebros deles não aprenderam ainda a “filtrar”. Isso é verdade pra todos nós quando bebês, mas alguns de nós são mais sensíveis que os demais, e o mundo é overwhelming (como fala isso em Português, amigas tradutoras?).
Gostei desse texto, que fala um pouco disso, e achei legal compartilhar porque de repente você é uma pessoa altamente sensível ou tem uma criança altamente sensível e isso pode ser útil.

From the trenches of parenting a highly sensitive child.

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