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porque faço questão de comentar

February 23, 2011 · 13 Comments

estou trocando emails com a bianca balassiano do possoamamentar.com.br, e ela tem dado ótimas dicas sobre como ordenhar quando voltar ao trabalho. dicas práticas, que venho experimentando, e agradeço a ela pela boa vontade, educação e disposição em ajudar alguém que não só não conhece como também é em muitos aspectos avessa às suas crenças. recomendo procurá-la quando precisarem de apoio individualizado na amamentação.

começo com essa breve introdução porque respeito a bianca, e agradeço sua gentileza, mas também discordo de algumas coisas que ela gosta e divulga, esse texto aqui por exemplo e tudo que ele implica.

considero esse texto um total desserviço às mulheres que se tornam mães e desejam amamentar, e vou usar trechos para explicar meus motivos (grifos meus):

Para dar de mamar deveríamos passar quase o tempo todo nuas, sem largar a nossa criança, imersas num tempo fora do tempo, sem intelecto nem elaboração de pensamentos, sem necessidade de defender-se de nada nem de ninguém, senão somente sumidas num espaço imaginário e invisível para os demais.

(…)

Isto é possível se se compreende que a psicologia feminina inclui este profundo afinco à mãe-terra, que o ser uma com a natureza é intrínseco ao ser essencial da mulher, e que se este aspecto não se põe de manifesto, a lactância simplesmente não flui.

faço antes um comentário breve mas importante: dou muito valor ao instinto, pois creio que são parte da nossa herança genética e nos direcionam para o caminho correto. entendo portanto que seja incentivado que cada mulher encontre seus instintos maternos, eventualmente escondidos pelo verniz da modernidade. isso é especialmente precioso para mulheres que, como eu, são excessivamente racionais. entrar em contato com seus instintos, seu eu-interior e tal é salutar e importante. mas, quero frisar com negrito, isso é assunto individual para ser tratado em terapia!

textos genéricos, apelativos e “definitivos” como esse são um banho de água fria em qualquer mulher que tenha dúvidas sobre sua capacidade de ser mãe e/ou amamentar. bem, vamos aos grifos.

passar quase todo tempo nuas é obviamente inviável, a menos que você seja naturista. e tem o inverno. e a convivência com outras pessoas, já que vivemos num mundo no qual não é natural andar pelado, por mais que seja gostoso. então já partimos da impossibilidade, o que me leva a perguntar qual é o benefício de escrever essa frase… vamos fazer então uma interpretação figurada, e torcer para que as demais coitadas que lêem esse texto tenham essa capacidade e não levem as coisas tão a sério. ela quer dizer que contato pele-a-pele com seu bebê é importante, talvez? genial, tenho certeza que é importante. por que então não dizer exatamente isso, já que estamos falando com mulheres procurando apoio para serem melhores mães? por que não falar sobre coisas possíveis, tais como massagem no bebê, banho conjunto, olho no olho, carícias durante o amamentar, etc.? não, vamos falar de coisas impossíveis, pra que a leitora não se identifique e se sinta inadequada.

imersas num tempo fora do tempo, sumidas num espaço invisível para os demais talvez se trate de desligar das outras coisas, cuidar somente do seu bebê e esquecer de todo o resto do mundo. é, talvez isso faça sentido nos primeiros dias depois que seu bebê nasceu, porque o tsunami de hormônios mais todas as novidades (sentimentos, pensamentos, rotina, etc.) mais a privação de sono realmente deixam a gente num outro universo, paralelo. fato é que passado esse choque inicial, a vida continua acontecendo ao seu redor. a roupa não se lava sozinha, as contas não se pagam, a comida não se apronta e você continua sendo parte de um sistema. o mundo não fica restrito a você e ao seu bebê. e não conta pra ninguém, mas você vai MORRER de saudade da sua vida anterior. você vai se arrepender de ter decidido ter um bebê, vai achar que não vai dar certo, que você não é capaz e que sua vida piorou pra sempre. e logo no mesmo segundo vai MORRER de culpa por pensar tudo isso, porque afinal você já ama aquela criatura mais que tudo na vida, e desejou muito ser mãe, quis e quer fazer o melhor por ela. por mais que as mães-odara tenham dito pra você que sua vida vai mudar pra melhor pra sempre, e que você será uma mamífera-empoderada, você vai se sentir mesmo é uma merda, e pior: sequer vai ter coragem de admitir. porque alguém fez a gentileza de escrever um texto deste tipo, dizendo que o certo é ficar nua, imersa num outro espaço-tempo, se dedicando à sua cria. e ai de você se sentir diferente. não é uma mãe perfeita, claro, e vai se sentir uma mãe de merda.

ser uma com a natureza é a melhor. por mais que eu creia (e creio) que precisamos sim nos conectar mais com nosso lado animal e natural, pois é benéfico em todos os aspectos da nossa vida (alimentação, comportamento, atividades fisiológicas, etc.), “ser um com a natureza” não quer dizer absolutamente nada. na-da. não consigo crer que exista uma pessoa com o racional e emocional em dia que possa dizer que é “um com a natureza”. primeiro porque não vivemos na natureza. eu não conheço uma única pessoa que viva na natureza, que só come o que planta/caça/colhe, que viva em meio à natureza de fato. só isso já é suficiente pra não permitir nenhum de nós ser “um com a natureza”. quando a autora diz que isso é intrínseco ao ser essencial da mulher, danou-se. porque se é intrínseco e você sequer entende o que isso significa e não sente isso, já se lascou toda sua capacidade de ser mãe, mulher, de amamentar. e a autora, ditatorialmente, ainda complementa dizendo que se esse não for seu caso (“ser uma com a natureza, como é intrínseco da essência feminina”), a lactância não flui. sério, gente? quem precisa ler isso? (eu já digo quem precisa ler isso, a pergunta foi retórica)

cara amiga autora, caras mães-odara que gostam muito desse texto, vou dar meu depoimento. eu não sou “uma com a natureza”; não passo o tempo todo nua e nem passei desde que meu filho nasceu; não fiquei num tempo-espaço diferente. inclusive assisti muito friends e tuitei enquanto amamentava meu filho a cada 2 horas. pois meu filho mamou lindamente até agora (está completando 6 meses), em livre demanda, e meu leite sempre fluiu firme e forte desde o dia em que ele mamou. e ele mamou de primeira, sem esforço. e foi na UTI, não numa caverna com sua mãe pelada e bem louca da cabeça, viu?

caras amigas leitoras que se sentem inadequadas com esse texto e essas idéias, eu explico como foi possível amamentar meu bebê sem ser essa mãe-gaia-telúrica perfeita: muita água, alimentação adequada, descanso (conforme possível), fé na fisiologia humana e força de vontade. o negrito na força de vontade, amiga, não é à toa. todas nós viemos prontas de fábrica pra amamentar, basta ter estímulo físico e psicológico. eu comecei a produzir leite DEPOIS que meu filho nascer e ANTES dele mamar. meu corpo estava lotado de prolactina, como é normal para as grávidas recém-paridas, prontinho pra produzir leite. eu ordenhei, e o leite começou a aparecer. aos pouquinhos, gotinhas, e foi aumentando conforme eu insisti. ou seja: fisiologia pronta + força de vontade = sucesso. não é fácil, e às vezes dói (seja ordenhar, seja o bebê mamar), mas dá certo. insista, beba água, SAIBA que você é perfeita e está pronta, pois a natureza fez você assim. não é necessário ser uma com a natureza, nem ficar pelada ou trancada numa caverna. a “lactância” vai “fluir”, sim. e se não fluir? é porque alguma dessas coisas deu errado – às vezes as coisas dão errado, porra! – e também não será o fim do mundo. seu filho vai viver, e você pode ser sim uma boa mãe a despeito (ha) desse episódio.

se você ainda não entendeu meu incômodo com esses textos depois disso tudo, eu resumo: eles fazem a maioria das mulheres se sentirem inadequadas porque não se identificam com a imagem de mãe-telúrica pintada como ideal. ao sentir-se inadequada, a mulher se enche de medos e dúvidas, e esses sentimentos são um veneno para quem precisa de segurança e estímulo para cuidar do seu filho e amamentar. desserviço absoluto.

bem, agora eu respondo minha própria pergunta: quem precisa ler isso? quem se identifica com essa imagem e quer se auto-afirmar. as mulheres que por algum motivo encarnam a mãe-gaia quando engravidam e dão seus filhos à luz gostam de se ver como provedoras absolutas, necessárias, mágicas e especiais. por mais que remetam à natureza, elas não se vêem como meros animais com tetas, não senhores. elas se vêem como deusas superpoderosas, sobrenaturais. a maternidade dá a elas uma dimensão que antes não existia, dá SENTIDO às suas vidas e as definem. antes de serem mães elas eram meras mortais; depois do parto, se tornam algo especial, fora do alcance dos que não passaram por essa experiência, são mamíferas (todos somos, os homens inclusos, dã), gaia. em bom português, elas piram na batatinha.

volto ao título: faço questão de comentar sobre isso, porque estou muito bem resolvida com meu papel como mãe e ser humano, com todas as minhas falhas. ser mãe, ou dar a teta pro meu filho, não define quem eu sou nem me torna melhor ou pior que ninguém. até porque já passei pela experiência e vi que sou capaz (a despeito de não ser “uma com a natureza” e tal), isso já não me afeta. mas e as muitas mulheres que vão passar ou estão passando por isso? espero que encontrem esse post e suspirem aliviadas. que digam “graças a GAIA tem mais gente nesse mundo que não pira na batatinha quando vira mãe”.

amigas mães-não-telúricas, esse post é pra vocês: vocês não estão sós! se precisarem de um conselho ou uma história que não passe por soluções mágicas e elfos na floresta, deixa um recado que se eu não souber, consulto as minhas amigas mães de verdade.

Categories: alimentação · amamentação · educação · maternidade · working mom

sobre tudo OU o post mais longo ever!

February 18, 2011 · 12 Comments

estou usando o calendário (papel) no quarto do otto pra registrar algumas coisas, mas acho que vale também registrar aqui. como pretendo organizar as informações a respeito de amamentação exclusiva e transição para outros alimentos, esse post pode ser reaproveitado.

desde que engravidei decidi que amamentaria o bebê por quanto tempo fosse possível, com ênfase nos 6 primeiros meses. inicialmente pensei em amamentar exclusivamente até o sexto mês, mas conversando com o pediatra decidimos começar o processo de oferecer outros alimentos a partir do quinto mês, para que eu ficasse mais tranquila quando voltasse a trabalhar (o otto vai estar com 6 meses e meio).

lendo sobre amamentação na internet parece que iniciar alimentação para o bebê antes do sexto mês é uma heresia. escolhi o pediatra do otto a dedo, ele é chefe da pediatria da UNICAMP, universidade que admiro muito. é um médico de meia-idade, com enorme experiência nesta área. as consultas são longas, e ele explica absolutamente tudo que queremos saber com riqueza de detalhes para não-leigos. ele nos trata como iguais e não como “pai e mãe”, respeitando nossa inteligência. em suma: confio no profissional que escolhi para nos aconselhar, e estou satisfeita com as explicações para as decisões tomadas. e posso estar errada, mas tenho a impressão que os sites de amamentação que vejo por aí pecam pelo excesso (entendo a radicalização pra mudar um quadro desfavorável, mas não vou entrar nessa), propõem uma abordagem que transforma a mãe em uma teta ambulante, que precisa estar 100% engajada e à disposição do bebê.

sim, eu acho que quem decide ter um filho precisa se engajar e estar à disposição dele o máximo possível. ênfase no POSSÍVEL, por favor. porque amamentar e cuidar do bebê precisam ser atividades com as quais a mãe tem algum prazer e recompensa, nenhum bebê se beneficia de uma mãe estressada, chateada ou arrependida de ter parido. e não me venham com papo moralista de “pariu agora aguenta”, guardem esse discurso pros seus pastores e equivalentes.

me parece (pelos inúmeros blogs e sites por aí) que existe algo como um “movimento de mães-odara” que se pauta numa “volta às origens” (se dedicar exclusivamente ao bebê, fazer tudo da forma mais “natural”). fala-se sobre amamentar por 2 anos, ou mais, adiar a inserção da alimentação para o bebê, etc. apesar de todas as boas intenções, vejo alguns pontos problemáticos (que vou detalhar) quando me deparo com esses discursos: elas falam como se tudo fosse fácil, intuitivo e lindo. e se você não consegue ou não quer “fazer sacrifícios” para atender seu filho, é uma mãe de merda. existem as mães de merda, sim, mas há todo um gradiente de mães humanas e possíveis entre as mães doriana e as mãe de merda!

vamos aos problemas que eu identifico:

cenário 1 – supondo que você seja uma das que tem emprego formal, sua licença foi recentemente estendida para 6 meses. se você conseguir trabalhar até o dia de ter seu bebê, voltará a trabalhar quando ele completar 6 meses. é possível mantê-lo mamando no peito este tempo, mas [problema 1] você não conseguirá acompanhar a transição para os alimentos, pois precisa voltar a trabalhar. e enquanto alguém [problema 2] faz a transição para alimentos sólidos, você precisa [problema 3] ordenhar leite para o seu bebê (falo disso daqui a pouco).

cenário 2 – você não tem emprego formal, não tem licença maternidade e vai ficar sem trabalhar pelo tempo que for possível para continuar sobrevivendo. supondo que seja possível ficar sem trabalhar e sem receber por 6 meses, enfrentará os mesmos problemas do cenário 1, e se não puder parar de trabalhar de jeito nenhum, terá que ordenhar leite para o seu filho loucamente, já que é a única alimentação dele.

cenário 3 – você consegue trabalhar meio-período ou em casa, e portanto consegue continuar suas atividades sem precisar ordenhar, deixar seus filhos com outras pessoas e delegar a transição. neste caso, precisará administrar seu tempo [problema 4] para adicionar à sua agenda todas as novas atividades que a maternidade traz consigo e ainda viver!

cenário 4 – você não precisa trabalhar ou se parar de trabalhar continua vivendo porém com menos “luxos”. pode amamentar seu filho quantos meses forem necessários e fazer a transição para alimentos sólidos com acompanhamento de perto. lucky you! caso você tenha condições de ter funcionários, sequer enfrentará o problema 4.

não vou comentar o problema 4, pois não é meu caso por enquanto. vamos aos demais:

problema 1: podem me chamar de controladora, mas faço questão absoluta de acompanhar de muito perto a iniciação do meu filho aos alimentos, observando sua reação, as mudanças que causam no corpinho e comportamento dele e principalmente a preparação e rotina. quando eu voltar a trabalhar (sou a mãe do cenário 1), a babá é quem vai alimentá-lo (com a supervisão ocasional do pai, que trabalha em casa), portanto quero garantir que ela faça como eu faria.

queria ver com meus próprios olhos essa transição, esse foi um dos motivos de antecipá-la para os 5 meses: quando ele estiver com 6 meses e meio e eu voltar ao trabalho, a transição está praticamente completa e eu já saberei como ele se comporta, o que gosta, como aceitou os alimentos e como está a digestão. ficarei mais tranquila e consequentemente serei uma mãe melhor pra ele.

o outro fator para o início da alimentação foi uma dica do pediatra: o otto aumentou a frequência de mamadas à noite a partir do quarto mês (3 em 3, ao invés de 4 ou 5 horas de intervalo enquanto dormia). o menino cresceu mais do que engordou, e parece que alguns bebês realmente precisam mamar mais para manter o ritmo do seu crescimento. a sugestão dele foi oferecer suco e fruta, pois se ele estivesse mesmo precisando de mais alimento, aceitaria bem e “aliviaria” essa maior frequência durante a noite. pois foi exatamente o que aconteceu: ele aceitou muito bem o suco e as frutas, e voltou a aumentar o intervalo de mamadas à noite. além disso, ele continua mamando de 3 em 3 horas de dia, o alimento novo é suplementar. não sei quando exatamente vamos começar a substituir, mas por enquanto ele toma suco E come E mama o dia todo e à noite.

e tem outra coisa: acho que se o alimento for ofertado e o bebê aceitar, é porque está pronto. o desenvolvimento dos bebês não é idêntico para todos eles, e 6 meses é somente uma data. não há nenhum marco de desenvolvimento humano que seja tão preciso. a data de aniversário é só uma data! não creio nessas “datas místicas”, prefiro experimentar e ver como o MEU bebê reage aos estímulos.

problema 2: “alguém”, ou “algum lugar”, é a grande questão que tira o sono das mães que precisam trabalhar. eu tenho uma sorte enorme, pois a maria que cuidava de nós e da casa também foi babá por muitos anos, cuidou de crianças a vida toda e AMA ser babá. ela nos ensina sobre como cuidar do otto, e estou 100% tranquila com ela assumindo os cuidados dele. mas e quem tem pouco dinheiro para pagar e não tem ninguém de confiança, faz como? antigamente as mulheres eram essencialmente donas de casa, as poucas que trabalhavam contavam com parentes e vizinhas que assumiam o cuidado das crianças. agora temos creches (péssimas, ouvi dizer) que cuidam das crianças “em lote” e babás que custam muito dinheiro.

financeiramente, no meu caso, compensa ter babá. o que ela ganha é muitíssimo menos do que eu ganho trabalhando fora, portanto a equação é positiva pra mim. além disso, prefiro trabalhar a cuidar da casa e de criança.

(pausa para as mães-odara se juntarem pra jogar um feitiço wicca pela blasfêmia)

e brincadeiras à parte, creio que é importante para toda criança conviver com outras pessoas que não somente os pais. especialmente quando se trata de filho único, os pais podem ser excessivamente protetores ou criar expectativas irreais. tou cansada de ver crianças totalmente dependentes dos pais, com dificuldade de socialização e com alto grau de ansiedade pra corresponder às expectativas dos pais (ou seja: com medo de errar e arriscar). gosto de ver meu filho brincando com a babá, o jardineiro, a faxineira e se divertindo um monte. espero que ele continue convivendo com pessoas diferentes de nós, que não esperam tanto dele e portanto vão cobrá-lo muito menos.

voltando ao problema: e as mães que trabalham e não têm esse suporte todo que eu tenho? precisam se adaptar e abandonar o medo e a culpa. seus filhos e elas mesmas terão outros obstáculos pra superar, mas a verdade é que no fim as coisas se ajeitam. o ser humano é muito adaptável e – na minha opinião – se beneficia de situações que requerem flexibilidade. aprendemos mais e mais rápido quando há barreiras a superar. não há porque se sentir culpada por não poder estar o tempo todo com seu filho, sua onipresença não é essencial para que ele seja feliz e cresça saudável.

é, mãe-odara, no fundo eu tou dizendo que seu filho superprotegido e que só ouve mozart e palavra cantada pode sim acabar se tornando um mala anti-social, enquanto o filho da sua empregada é feliz e sociável, apesar dos pesares. é claro que seu filho terá mais chances, porque é mais rico e mais bem-relacionado, mas talvez não seja tão feliz…

o que me leva a tópico que pretendo detalhar em outro post: é mais importante ser bem-sucedido ou ser feliz? (supondo que algumas opções inviabilizam os 2 ao mesmo tempo)

problema 3 – a ordenha. o processo é chato, um pouco doloroso e cansativo. só muita vontade de alimentar seu filho com seu leite motiva uma mãe a fazer isso, acreditem. não é preguiça nem má vontade, caso isso tenha passado pela cabeça de vocês. é dureza.

suponha então que você esteja muito disposta a manter seu bebê mamando do seu leite, e vai voltar a trabalhar. percebam os problemas logísticos e qual é o tamanho da vontade que uma mãe tem que ter pra conseguir o feito:

– é preciso ordenhar pelo menos 2 vezes por dia no trabalho, para manter o fluxo do leite e conseguir volume. isso significa pausas de pelo menos 30min. e reze para seu empregador liberar você, pois as pausas de amamentação previstas por lei valem somente até o sexto mês do bebê;

– é preciso armazenar o leite ordenhado em vidros estéreis, na geladeira, até a hora de voltar pra casa. e para transportar de volta, é preciso bolsa térmica. pense em esterilizar os vidros diariamente e armazená-los sabe deus onde na sua empresa;

– é preciso privacidade para a ordenha, ou seja, sala fechada. todos os dias, 2 vezes por dia;

– é preciso uma máquina elétrica de ordenhar, ou você pode subir para 2 pausas de 1h por dia;

é claro que você pode ordenhar e jogar o leite fora, mas só funciona se seu filho não mamar mais durante o dia… ainda assim, precisa das pausas, da privacidade, etc.

agora faça assim: encaixe mais essa função no seu dia, e pense se os ambientes de trabalho facilitam o procedimento. pense com calma, e pense de novo na próxima vez que criticar as mães que não querem ou não conseguem manter essa rotina para os seus filhos.

resumindo…

tem que ter muito boa vontade. e mesmo com boa vontade, precisa também de condições favoráveis e muita, muita ajuda. e nada disso adianta se a mãe em questão está estressada, infeliz, culpada e se martirizando porque não é perfeita. e adianta menos ainda se a mãe não tem condições de se alimentar direito ou dormir porque não tem dinheiro e nem tempo.

cada vez mais creio que mães felizes, realizadas (pessoal e profissionalmente) e tranquilas são as melhores mães que existem. amamentar até os 7 anos no peito e estar presente 100% do tempo na vida do seu filho não fazem de você uma mãe melhor necessariamente e nem tornam seu filho necessariamente uma criança feliz. o vínculo com seu filho não se dá no parto, nem na amamentação, mas no dia a dia, no decorrer dos anos. é preciso parar com essa história da carochinha que “amor de mãe é imediato e incondicional”, que surge como num passe de mágica quando o bebê passa pelo canal vaginal ou quando mama no seu peito. isso é um desserviço à saúde mental da mulher. já existem hordas de mulheres deprimidas porque não conseguem corresponder a esse ideal de mãe perfeita. esse tipo de discurso é tão nocivo quanto as capas de revista com mulheres perfeitas. não basta ter que ser a mulher perfeita, agora tem a patrulha da mãe perfeita. chega!

e se você tem dúvidas sobre isso ser balela de mãe-odara doida que precisa ir pra terapia, voltemos às origens da nossa espécie: humanos são gregários, vivem em grupo sempre. as crianças não ficam grudadas em suas mães o tempo todo, elas passam de colo em colo, com outras crianças maiores ajudando a cuidar inclusive. logo que conseguem colocar coisas na boca já começam a ser alimentadas, e o leite do peito é dado sempre que possível pois é mais prático. nenhuma mãe humana, na sua essência, amamenta porque “é lindo e é bom para o bebê e cria vínculo”. amamenta porque é PRÁTICO (e por isso é bom, e perfeito. a natureza é sábia). tão logo a crianças começam a andar e pegar coisas, começam também a ter funções PRÁTICAS. crianças sempre foram mão de obra, essa coisa de “proteger a criança” é coisa muito, muito recente. crianças humanas não ficavam sendo paparicadas por adultos e nem “se dedicando a atividades lúdicas”. elas aprendiam enquanto brincavam, ajudando os adultos. todos os animais são assim, aliás. e os papais não ficavam trocando fraldas, iam caçar; as mamães iam colher comida, cuidar das coisas, revezando a função de cuidar das crianças. até porque se não fosse assim, todo mundo morria de fome, percebe?

OU SEJA: essa romantização toda do parto, da amamentação e da criança é recentíssima e na minha opinião uma PUTA viagem errada. tem gente que precisa arranjar um tanque de roupa pra lavar, um quintal pra varrer, sabe, se ocupar. façamos as coisas da forma mais natural, sim, até porque é comprovadamente bom, pela evolução. o que não dá é essa viagem errada, não senhores.

cada vez mais estou convencida que esse hype todo sobre parto natural e amamentação xiita (à revelia das condições existentes) tem a ver única e exclusivamente com a necessidade de algumas mulheres de encontrarem seu lugar no mundo. várias delas só se definem como “mães” e “mamíferas”, e se apegam a isso com unhas e dentes. a falta de outras realizações relevantes (na cabeça delas, claro. o resto do mundo doesn’t give a flying crap a respeito) faz com que elas fiquem cegas e radicais. como faz? vai pra terapia. pára com essa maluquice de tentar provar que existe algo como a maternidade perfeita.

da minha parte, me esforçarei pra fazer o melhor e o possível, sem me violentar ou sacrificar. tenho certeza que serei uma mãe melhor se for feliz e não me sentir cansadíssima e/ou culpada. tudo o que eu mais quero é que meu filho seja INDEPENDENTE de mim, e não o inverso. portanto, farei o que estiver ao meu alcance pra que o otto tenha condições de ser independente, e quando ele estiver pronto, assim será.

Categories: alimentação · amamentação · maternidade · working mom