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..30.1.02..

Soneto do Maior Amor
(Vinícius de Moraes)

Maior amor nem mais estranho existe
Que o meu, que não sossega a coisa amada
E quando a sente alegre, fica triste
E se a vê descontente, dá risada

E que só fica em paz se lhe resiste
O amado coração, e que se agrada
Mais da eterna aventura em que persiste
Que de uma vida mal aventurada.

Louco amor meu que quando toca, fere
E quando fere vibra, mas prefere
Ferir a fenecer - e vive a esmo

Fiel à sua lei de cada instante
Desassombrado, doido, delirante
Numa paixão de tudo e de si mesmo

Enviado pra mim pelo Marcelo. Obrigada :)

recitado por Zel @ 6:24 PM

 

..24.1.02..

Mais alto, sim! mais alto, mais além
Do sonho, onde morar a dor da vida,
Até sair de mim! Ser a Perdida,
A que se não encontra! Aquela a quem

O mundo não conhece por Alguém!
Ser orgulho, ser aguia na subida,
Até chegar a ser, entontecida,
Aquela que sonhou o meu desdém!

Mais alto, sim! Mais alto! A Intangível
Turris Eburnea erguida nos espaços,
A rutilante luz dum impossível!

Mais alto, sim! Mais alto! Onde couber
O mal da vida dentro dos meus braços,
Dos meus divinos braços de Mulher!

(Florbela Espanca)

recitado por Clarice M. @ 12:51 PM

 

..8.1.02..

Meu sonho

Parei as águas do meu sonho
para teu rosto se mirar.
Mas só a sombra dos meus olhos
ficou por cima, a procurar...
Os pássaros da madrugada
não têm coragem de cantar,
vendo o meu sonho interminável
e a esperança do meu olhar.
Procurei-te em vão pela terra,
perto do céu, por sobre o mar.
Se não chegas nem pelo sonho,
por que insisto em te imaginar ?
Quando vierem fechar meus olhos,
talvez não se deixem fechar.
Talvez pensem que o tempo volta,
e que vens, se o tempo voltar.
(Cecília Meireles 1901-1964)

recitado por Gui @ 11:54 AM

 

..3.1.02..

APROXIMA-SE DO RETIRANTE O MORADOR DE UM DOS MOCAMBOS
QUE EXISTEM ENTRE O CAIS E A ÁGUA DO RIO

(...)
-Seu José, mestre carpina
 que lhe pergunte permita:
 há muito no lamação
 apodrece a sua vida?
 e a vida que tem vivido
 foi sempre comprada à vista?
-Severino, retirante,
 sou de Nazaré da Mata,
 mas tanto lá como aqui
 jamais me fiaram nada:
 a vida de cada dia
 cada dia hei de comprá-la.

-Seu José, mestre carpina,
 e que interesse, me diga,
 há nessa vida a retalho
 que é cada dia adquirida?
 espera poder um dia
 comprá-la em grandes partidas?
-Severino, retirante,
 não sei bem o que lhe diga:
 não é que espere comprar
 em grosso de tais partidas,
 mas o que compro a retalho
 é, de qualquer forma, vida.

-Seu José, mestre carpina,
 que diferença faria
 se em vez de continuar
 tomasse a melhor saída:
 a de saltar, numa noite,
 fora da ponte e da vida?

(...)

O CARPINA FALA COM O RETIRANTE QUE
ESTEVE FORA, SEM TOMAR PARTE EM NADA

-Severino retirante,
 deixe agora que lhe diga:
 eu não sei bem a resposta
 da pergunta que fazia,
 se não vale mais saltar
 fora da ponte e da vida;
 nem conheço essa resposta,
 se quer mesmo que lhe diga;
 é difícil defender
 só com palavras, a vida,

 ainda mais quando ela é
 esta que vê, severina;
 mas se responder não pude
 à pergunta que fazia,
 ela, a vida, a respondeu
 com sua presença viva.

 E não há melhor resposta
 que o espetáculo da vida:

 vê-la desfiar seu fio,
 que também se chama vida,
 ver a fábrica que ela mesma,
 teimosamente, se fabrica,
 vê-la brotar como há pouco
 em nova vida explodida;

 mesmo quando é assim pequena
 a explosão, como a ocorrida;
 mesmo quando é uma explosão
 como a de pouco, franzina;
 mesmo quando é a explosão
 de uma vida severina.


(João Cabral de Melo Neto, em Morte e Vida Severina)

recitado por Clarice M. @ 1:16 PM

 


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