tenho fascinação por idiomas, pelas palavras e por histórias; adoro contar histórias, converter idéias ou sentimentos em palavras, tecer fios e tramas, criar enredos. transformar idéias em letras e/ou sons parece de alguma forma concretizá-las, torná-las reais. alguns diriam que nesse processo eu fantasio demais, engano ou até minto, mas que nada: as coisas são como nós as percebemos e é assim que eu percebo tudo, com muita cor e muito som.
sei que não percebemos a realidade da mesma forma, por isso nem me preocupo mais com fazer sentido, escrever ou contar e-xa-ta-men-te o que quero dizer ou mesmo tirar fotos (apesar da profusão de fotos disponíveis, tenho certa resistência a fotografar, acreditem). não adianta me preocupar se consigo ou não de alguma forma transmitir o que vejo/percebo/sinto para todos, já que o resultado não chega nem perto do que se passa aqui no meu mundo interior. é um pequeno problema de output device — ainda precisamos avançar bastante nesse sentido 😉
e não faz mal, continuo tentando me comunicar assim mesmo, mal e porcamente. mas o que me levou a escrever isso tudo foi o fim da leitura do último livro do neil gaiman, os filhos de anansi, que comprei faz tempo mas li mesmo só nas férias. é delicioso, como tudo que ele faz. me deixou por dias pensando, sem vontade de ler mais nada.
mas ao mesmo tempo o livro me deixou louca de vontade de escrever, trouxe de volta um assunto que me assombra há tempos: o poder das palavras e das histórias. lembrei de quando li cidade de vidro, do paul auster há tantos anos e fiquei um tempão pensando em como deus criou o mundo — ele falou e tudo se fez! ok, vocês que têm educação religiosa podem achar bobo meu encantamento com isso, mas lembrem que sou uma atéia batizada-por-pressão-de-avós, não tenho nenhuma cultura religiosa além da básica do curso de história (racionalizada e sem nenhum romantismo, sabem como é). achei lindo descobrir que deus, o todo-poderoso, onipresente onisciente e oni* precisou (ou quis) falar, colocar a criação em palavras pra que elas de fato se fizessem.
e o livro do gaiman é (sempre, aliás) sobre as histórias, lendas e seus poderes. ele também sabe o poder das palavras e dos nomes e nunca deixa de nos lembrar disso nas suas maravilhosas histórias do sandman — se você não leu todas elas vá resolver essa falha de caráter a-go-ra 😀
leiam o livro, se puderem, mas principalmente pensem, falem, escrevam. mas com cuidado, sempre, porque é verdade: as palavras têm poder.
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e procurando cidade de vidro achei essa leitura legalzíssima sobre o livro e um trecho genial, pra pensar:
“nossas palavras não têm mais correspondências com o mundo. quando as coisas eram íntegras, sentíamo-nos confiantes de que nossas palavras podiam expressá-las. mas aos pouco elas foram se fragmentando, formando o caos. a partir de então, a cada vez que tentamos falar das coisas que vemos, acabamos por distorcer aquilo que queremos expressar.” (paul auster, cidade de vidro)
que assim seja.
Zel, bem vinda, eu tava com saudade! Estou sem tempo para deixar um comentário mínimamente inteligente (se eu lhe contasse o que anda rolando na minha vida você faria uma petição no Senado pra me internar), então só vou dizer que todas essas questões andam muito na minha cabeça também. Sempre.
Fica um beijo pra você, e saludos pra o Fer.
Fui!
Cidade de Vidro é mesmo um livro definitivo.
Que bom que você voltou, Zel.
oi queridos, eu tava com saudade de vocês também 🙂 beijão!