descobri que hoje é o dia nacional da poesia (14 de março) e na próxima sexta (21 de março) é o dia internacional da poesia – essas datas comemorativas são algo além da compreensão…
mas tudo bem: é uma boa desculpa pra resgatar textos das minhas duas poetisas preferidas, adélia prado e hilda hilst.
no dia internacional eu publico duas dos meus poetas preferidos 🙂
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quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
não sou tão feia que não possa casar,
acho o rio de janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
mas o que sinto escrevo. cumpro a sina.
inauguro linhagens, fundo reinos
– dor não é amargura.
minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade da alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
mulher é desdobrável. eu sou.
(com licença poética, adélia prado)
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não me procures ali
onde os vivos visitam
os chamados mortos.
procura-me
dentro das grandes águas
nas praças
num fogo coração
entre cavalos, cães,
nos arrozais, no arroio
ou junto aos pássaros
ou espelhada
num outro alguém,
subindo um duro caminho
pedra, semente, sal
passos da vida. procura-me ali.
viva.
(poesia XXII , hilda hilst)
“Talvez sonhasse, quando a vi. Mas via
Tudo ouviras, pois que, bondosa e pura
Tantos esparsos vi profusamente
Como a floresta secular, sombria
Dizem todos: “Outrora como as aves
Em mim também, que descuidado vistes
Não têm faltado bocas de serpentes
Em que céus mais azuis, mais puros ares
De outras sei que se mostram menos frias
Deixa que o olhar do mundo enfim devasse
Todos esses louvores, bem o viste
Sonhei que me esperavas. E, sonhando
“Ora (direis) ouvir estrelas! Certo
Viver não pude sem que o fel provasse
Inda hoje, o livro do passado abrindo
La fora, a voz do vento ulule rouca
Por estas noites frias e brumosas
Dormes … Mas que sussurro a umedecida
Sai a passeio, mal o dia nasce
Olha-me! O teu olhar sereno e brando
Sei que um dia não há (e isso é bastante)
Quando te leio, as cenas animadas
Laura! Dizes que Fâbio anda ofendido
Vejo-a, contemplo-a comovido
Tu, que no pego impuro das orgias
Quando cantas, minh’alma desprezando
Ontem – néscio que fui! – maliciosa
Pinta-me a curva destes céus… Agora
Por tanto tempo, desvairado e aflito
Ao coração que sofre, separado
Sonho
Longe de ti, se escuto, porventura
Leio-te: – o pranto dos meus olhos rola: –
Como quisesse livre ser, deixando
Quando adivinha que vou vê-la, e a escada
Pouco me pesa que mofeis sorrindo”
(Via Láctea – Olavo Bilac – meu favorito)
Ah, Zel… Prosa Reunida da Adélia Prado é meu livro de cabeceira.
beijos