o encantamento pelo live mocha me fez voltar a um assunto que está aqui na cachola faz tempo – a ditadura do aprendizado de inglês.
há 13 anos trabalho diariamente em ambientes nos quais falar / entender / escrever em inglês é praticamente obrigatório. boa parte do meu sucesso profissional é conseqüência do meu domínio do idioma, muito embora eu não me considere exatamente fluente – o conceito de fluência varia bastante, pelo que percebi por aí, mas isso é outro assunto.
atualmente trabalho numa empresa americana cuja estratégia de crescimento é a aquisição de outras empresas menores espalhadas pelo mundo. operamos hoje basicamente nos estados unidos, méxico, brasil, escócia, itália, alemanha, china e índia (entre outros países com menor representação). o idioma “oficial” da empresa é, por questões práticas, o inglês. o sistema hierárquico é o que se chama de matricial, significando na prática que todas as pessoas espalhadas pelo mundo de alguma forma têm que se relacionar com indivíduos de outras nacionalidades (daí a necessidade de todos adotarem um idioma comum).
todo mundo é incentivado (com subsídio, aqui no brasil) a estudar inglês, para que seja possível trabalhar de forma globalizada. até aí nenhuma novidade, muitas empresas trabalham assim, mas percebi uma diferença interessante nesta empresa: existe uma atitude verdadeiramente globalizada também por parte dos americanos, a nossa “matriz”. por exigência da empresa, eles estudam a cultura dos outros países, garantindo que entendem as pessoas com as quais precisam trabalhar. eles aprendem noções do idioma, comportamento, política, geografia e costumes. quando vêm ao brasil, eles sabem, por exemplo, que no geral somos menos assertivos e que é importante demonstrar interesse por assuntos pessoais.
todos os gringos com os quais tenho tido contato em visitas ao brasil (e são muitos, de diferentes perfis) demonstram respeito pela nossa cultura e idioma. eles querem aprender, fazem muitas perguntas e se interessam pelo que temos de diferente, além de sempre reforçarem a admiração pela nossa disposição em aprender inglês.
e é aqui que eu queria chegar: eles vêem nosso empenho em aprender inglês da forma que eu considero mais adequada, como um diferencial. eles não acham que nós temos obrigação de saber (e bem) inglês, inclusive eles se desculpam por não saberem o nosso idioma. eles partem do pressuposto (correto, na minha opinião) de que é pura cortesia da nossa parte adotarmos o idioma deles nas nossas conversas enquanto eles estão aqui.
acredito que essa atitude de respeito pelos colegas de outros países que adotam o idioma deles como padrão é conseqüência da estratégia da empresa (incorporação), pois a “matriz” não comprou uma empresa aqui no brasil pra “dar um jeito nela”; a empresa já era lucrativa e tinha suas qualidades antes de ser comprada. a idéia é incorporar lucro e conhecimento e não colonizar os pobres brasileiros (ou indianos, ou chineses, ou…) e para isso o respeito é fundamental.
essa experiência tem reforçado ainda mais meu desgosto com os brasileiros que sofrem de baixa auto-estima e lambem a bunda (pra usar uma expressão norte-americana) dos americanos. estou falando dos que desprezam pessoas que não falam inglês e não se interessam pelo idioma porque acham que é “mandatório” falar inglês. ninguém é obrigado a falar inglês e tampouco falar muito bem. é aceito sem dramas por aqui que nem todo mundo fala inglês, e nos adaptamos a isso. as pessoas que têm dificuldades com o idioma não foram demitidas depois da aquisição da fábrica no brasil (que aconteceu há mais de 10 anos), foram criados mecanismos de convivência, já que o objetivo é aproveitar o melhor de cada profissional.
entendi, trabalhando aqui, que falar inglês é sim essencial para crescer profissionalmente, mas que também há lugares bons pra quem não quer ou não consegue dominar o idioma. descobri, de quebra, que os americanos (que muitos no brasil consideram a medida de todos os povos) nos respeitam e enxergam em nós as qualidades que aprendemos a ignorar.
eu gostaria que o reconhecimento e respeito estrangeiro por nós fosse um tapa na cara dos nossos conterrâneos complexados que se vêem como “exceções” numa nação de índios. a verdade, infelizmente, é que nossa auto-estima é tão baixa que ainda precisamos deles (quem quer que sejam) pra nos validar e tentar nos convencer que temos muitas qualidades e potencial apesar de também termos inúmeros problemas como nação.
será que sempre fomos (como povo) adolescentes precisando de aprovação ou nos tornamos assim? não sei se nossa auto-estima melhoraria se o país fosse melhor ou se o país só vai melhorar quando pararmos de achar que somos fracassados…
e vocês acharam que eu tinha respostas, é? 🙂
Zel, vira-e-mexe eu apareço por aqui, dou uma lida, mas fico levemente acanhada em comentar… mas nesse post, me encontrei. Sempre achei um saco (pra dizer o mínimo) ter que falar inglês pq todo mundo fala inglês. E sempre achei bacana perceber que os gringos que encontrei por aqui curtissem os esforços de falarmos a língua deles. Alguns, inclusive, corrigindo este ou aquele errinho. O aprendizado de língiua estrangeira, assim como de qq coisa, deve partir da vontade e não da obrigatoriedade. Acho que a imposição é um dos grandes motivos que muita gente trava na hora de aprender. Pena, né? Bjus!
Falar inglês porque “todo mundo fala” é a melhor maneira de pegar raiva do idioma. Aliás, qualquer idioma ou atividade, quando feita com raiva ou obrigação, dana-se toda. Exemplo: eu falo feliz da vida inglês e francês, estou estudando alemão e me divertindo horrores. Pergunta se eu consigo falar espanhol, que é tão mais “fácil” que francês ou alemão… Nem que me paguem. Tanto que me forçaram a aprender que o cérebro criou mecanismos de defesa contra o idioma 🙁 O que é uma pena, eu acho…!
Zel, nunca comentei aqui, mas hoje tenho algo pra ‘conversar’ a respeito do teu post. Atualmente eu faço faculdade de estatística e estou no início dos 20 e poucos anos.
Eu concordo contigo quando tu falas que inglês é um diferencial e é essencial para crescimento profissional (em algumas situações). Na universidade eu vejo que é quase o que determina a qualidade da sua pesquisa e os seus horizontes de leitura. Vejo muitos dos meus colegas falarem que vão fazer curso de inglês depois da formatura, mas acho que aprender antes abre tantos outros espaços… E até oportunidades. Acabo pensando que a pessoa que deliberadamente não escolhe estudar inglês, lá na situação da minha salinha de aula de curso que não tem bibliografia adequada em português, acaba se limitando muito.
E de fato tem muitos americanos que sabem da dificuldade de aprender outros idiomas e de certa forma ‘valorizam’ nosso esforço e interesse em saber inglês, sem achar que isso é algo obrigatório.
Acabei falando, falando e não concluindo muita coisa. Enfim, era só pra deixar meu relato, sem obrigação de maiores conclusões. Um bom feriado pra ti.