entre a fé e a realidade

o assunto religião/crença sempre aparece na minha pauta, seja qual for o motivo, mas este meu post me fez pensar ainda mais profundamente a respeito. aliás, uma das coisas que tenho achado mais legais de me tornar mãe é repensar ou rever conceitos.

pois que somos ateus, eu e fer. acho que ele é um pouco mais radical que eu, pois sequer admite a possibilidade da existência das coisas esotéricas. eu de fato não acredito em reencarnação, espírito, alma, céu, deus, shiva, nada disso, mas não me surpreenderia se existisse.

mais que ateus, somos fãs de richard dawkins, que é bastante radical. muito embora eu concorde com ele, não costumo ironizar e nem menosprezar quem tem fé religiosa de qualquer natureza. acho a fé religiosa desnecessária, mas compreendo e respeito as motivações de quem as tem.

assumir que é ateu me parece equivalente a dizer que é um extra-terreste – as pessoas ficam espantadas e assustadas com esse posicionamento. e como é de praxe, medo e espanto se transformam rapidamente em raiva e agressão. nosso jardineiro, que é protestante (ou coisa parecida), quando descobriu que somos ateus, ficou boquiaberto. como ele gosta de nós e nos respeita, foi até educado e fez algumas perguntas, mas ficou claro que pra ele seria tão espantoso quanto se disséssemos que somos canibais.

a dificuldade das pessoas que têm fé religiosa em entender o ateísmo geralmente (se não sempre) passa pelo seguinte: como alguém pode viver e ser feliz acreditando que esta vida é tudo que temos, que não há nada antes, nem depois? que simplesmente nascemos, crescemos e morremos?

o espanto é sintomático, e talvez nem precisasse de explicação, mas eu explico: ateus não precisam crer que há outras oportunidades de ser feliz e se realizar. e exatamente porque não cremos que há “segunda chance” ou “plano divino”, tomamos as rédeas de nossas próprias vidas e fazemos o melhor dela. porque pra nós, que não acreditamos em deus, karma ou reencarnação, só essa chance conta. e é nesta vida que faremos o melhor e seremos mais felizes. esta vida é tudo que temos!

a coisa que mais me incomoda na fé religiosa (e todas têm algo relacionado a isso, sem exceção) é a constante explicação ou justificativa para problemas, dores, incômodos e insucessos. você é pobre e desgraçado? é porque deus não escolheu você, ou porque é um pecador, ou porque foi torquemada na encarnação anterior ou… sei lá, preencha a lacuna. e tudo bem se sua vida for uma porcaria, porque sempre tem o paraíso ou a próxima vida pra compensar.

vejam que não estou dizendo que todo mundo que tem fé religiosa entra nessa onda; mas a maioria entra, sim. e neste caso sou da mesma opinião que o radical dawkins: a fé pode tornar as pessoas alienadas, ignorantes, passivas e conformadas. mas pode também torná-las menos miseráveis, é claro, quando transfere para um ente externo a responsabilidade por sua própria felicidade e sucesso.

no fundo, esse post é um recado para os crentes: não tenham medo ou pena de nós, ateus. somos felizes simplesmente crendo em nós mesmos, não precisamos e não desejamos crer em nada mais. não é desistência ou falta de fé – é simplesmente a aceitação de que não é preciso haver explicação, justificativa ou um “poder maior”.

6 comments to “entre a fé e a realidade”
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  1. E repalpitando um palpite de ontem com a Zel, a MINHA impressão é de que boa parte dos crentes (de quaisquer crenças) olha para mim e diz/pensa: “Mas então você acredita que é SÓ isso?”

    E eu não acho que é só isso. Eu acho que “isso aqui” que a gente vive já é muito, é incrível, já é fantástico (em diversos sentidos, inclusive o literário. O lado científico já me parece quase mágico mesmo), é “TUDO ISSO”.

    E por isso, talvez, não sinto falta do “depois” (ou de outro depois que não virar comida de verminho e adubo).

    Ah, e uma NOTA IMPORTANTE: o jardineiro aqui nos acha canibais muito simpáticos e agradáveis, acreditem. E ele, religiosíssimo, também é.

  2. Zel, a mamãe me disse,depois que eu estava adulta é claro, que eu poderia mudar de religião a hora que quisesse, mas que ela fez parte dela me levando à igreja, não só por mim, mas pela sociedade, porque, segundo ela, temos que ter medo de alguma coisa se não esse mundo está perdido.

    hehe, achei super interessante a teoria dela e amei a sinceridade, acho que ela tinha medo que uma das filhas virasse uma Richthofen.

  3. Zel,

    muito bom seu post. Tenho a impressão que ofendo as pessoas quando as informo que sou ateu. De forma que mantenho essa informação meio que em segredo, não comento nada a respeito disso (a não ser que me perguntem diretamente). Tem gente que acha até que faço isso de pirraça ou por orgulho.

    Uma coisa que não dá para tolerar é a intolerância.

    Um abraço,

    Neto

  4. Vim comentar só porque Zel “reclamou” no Twitter que ninguém tinha comentado. Mas na verdade eu não comentei porque não midentifiquei, já que “creio em Deus pai todo poderoso” eu mesma e ao mesmo tempo acho super normal alguém ser ateu, como ter qualquer outra religião ou não saber em quê acreditar. Porque no fim das contas ninguém tem a verdade suprema mesmo (só Deus, claro)(foi uma gracinha) e é tudo crença.

    Eu concordo plenamente com a parte que a fé pode tornar as pessoas alienadas, ignorantes, etc. E me incomodo com essas coisas de que a vida tá uma merda “porque Deus quis” (apesar de dizer “se Deus quiser” aqui e ali). Mas eu bem sei que nós somos poucos.

  5. Zel, tenho acompanhado os posts daqui e do fabricando, e penso como você com relação à reação das pessoas frente a ateus. Sou ateia e meu marido, com formação cristã MUITO pesada, se considera agnóstico – embora JAMAIS se coloque desta forma para sua família, que é muito religiosa e tem grandes dificuldades de enxergar uma realidade não-religiosa. Basta dizer que nossa decisão de não batizar nosso filho causou uma situação de saia justíssima, que foi creditada na minha conta e deixada para que eu explicasse. O que disse? Que nosso propósito é oferecer liberdade de escolha e questionamento para nosso filho e conhecimento livre acerca de qualquer coisa que lhe interessasse. Nenhuma imposição. Fé é pessoal e intransferível e não cabe sequer aos pais impor alguma aos filhos.

    Bom. Se vocês têm famílias que interferem pouco no aspecto religioso vai ser mais tranquilo. Dependendo da escola e do círculo de convivências de vocês e do Piolho o ateísmo não será motivo de choque, espanto ou coisas assim. Espero. Ainda não nos confrontamos muito com isso porque Alê ainda vai fazer 3 anos. Por hora só tivemos cuidado extra em pesquisar escolinha aqui em Bauru que não utilizasse abordagem religiosa. Em duas instituições perguntamos se a escola fazia menção a alguma religião ou entidade religiosa e foi-nos dito, veja você, que “não, a escola não é religiosa, mas a gente só faz uma oração pro papai do céu antes de comer, assim, um respeito”. Limei NA HORA as duas escolas da lista. As confessionais nem fomos visitar, por melhores que fossem. Mas de um modo geral acho que escolas não estão inseridas em uma realidade de secularismo: pressupõe-se, de antemão, que todo mundo seja ao menos teísta. O que é errado. O que aumenta a sensação de sermos “estranhos no ninho”, “avis rara”, é a impressão que tenho.

    Recomendo uma leitura interessante pra vocês, que têm o Piolho a caminho: McGowan, Dale. Parenting beyond belief: on raising ethical, caring kids without religion. AMACOM, 2007.

    Beijo!

  6. Ola Zel, tudo bem?

    Por um tempo, não cria em absolutamente nada….

    Depois comecei a notar que determinadas coisas eram especiais demais para serem mero acaso, ou pura obra científica…

    Em especial gerar um filho… Entendi que esse mistério é divino e não científico…

    Mas o legal é respeitar a crença de cada um , independente de qualquer coisa… Sou cristã , acompanho seu blog e gosto de inúmeros assuntos que vc aborda e por te acompanhar me senti a vontade de comentar…

    Hj tenho um bb de 3 anos, embora fosse estéril e não podendo engravidar , fui agraciada com esse imenso presente que é ser mamãe…

    Um super beijo e que Deus a abençoe ricamente…

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