Esse poema foi escrito por Neil Gaiman e apresentado pela Amanda Palmer (link lá embaixo), e Daniela e eu ficamos tão encantadas que fizemos uma tradução a 4 mãos para espalhar essa lindeza pelo mundo dos que falam Português.
Mulhes podem ser tudo que quiserem, especialmente cientistas 🙂
❤️🍄
As Que Colhem Cogumelos
A Ciência, criança, como se sabe é o estudo
da Natureza e dos mecanismos do Universo.
Baseia-se na observação, no experimento, na medição,
e formulação de leis que descrevam os fatos
assim revelados
Há muito tempo, dizem,
já existia um cérebro na cabeça dos homens
preparado para perseguir feras desembestadas
lançando-os cegamente rumo ao desconhecido,
para depois, perdidos, encontrar seu caminho de volta
carregando juntos o antílope abatido.
Ou, nos dias ruins, antílope nenhum.
As mulheres, que não precisavam perseguir feras,
tinham cérebros atentos aos marcos do caminho
e ao trajeto possível entre um e outro.
À esquerda no espinheiro, passando os seixos
olhe bem os ocos das árvores caídas
porque neles pode haver cogumelos.
Antes da clava e da pedra lascada
a primeira ferramenta que existiu
foram as tipoias de carregar os filhos
amarradas para deixar as mãos livres
e ter onde guardar as frutas e os cogumelos
e as raízes e as folhas boas,
as sementes e os bichinhos.
Só então veio o pilão de amassar,
de macerar, de moer e quebrar.
E havia os dias em que os homens
perseguiam as feras nas matas escuras,
e não voltavam mais de lá.
Há os cogumelos que matam
e os que revelam deuses,
e há os que saciam a nossa fome.
Há que se saber identificar.
Uns são mortíferos se comidos crus
E novamente nos matam se aferventados
Mas se fervidos na água fresca que se descarte
e depois mais cozidos, servem então para comer.
Há que se saber observar.
Observar crianças que nascem,
medir as barrigas, as formas dos seios
E com a experiência descobrir
maneiras seguras de partejar.
Observar tudo.
E assim as que colhem cogumelos
palmilham caminhos
de olhos atentos ao mundo
vendo o que há para observar.
E algumas vicejaram
lambendo os lábios
E outras caíram mortas
varadas de dor.
E assim foram estabelecidas
e passadas as leis
sobre o que era ou não seguro.
Há que se saber formular.
As ferramentas que criamos
para construir nossas vidas:
as roupas, a comida, o caminho para casa…
Todas nasceram da observação,
do experimento, da medição – e da verdade.
E a Ciência, lembre,
é o estudo da Natureza e dos mecanismos do Universo.
Que se baseia na observação, no experimento, na medição
e na formulação de leis que descrevam o que se dá.
A corrida não para.
Uma cientista dessas primeiras
desenhou feras na caverna
para os filhos da irmã,
já bem saciados de frutas e cogumelos,
mostrando bichos que eram bons de caçar.
Os homens correm perseguindo feras desembestadas.
As cientistas caminham com calma
pelo pé da colina
e descem para a beira d’água,
até depois de onde o barro vermelho brota.
Elas levam os filhos nas tipoias que teceram
e têm as mãos livres para colher cogumelos.
(Neil Gaiman)
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O original:https://www.brainpickings.org/2017/04/26/the-mushroom-hunters-neil-gaiman/