Xô Narcisa

Faz tempo que venho tentando entender porque me incomoda tanto mulheres que se empenham tanto em divulgar sua beleza física. Muita selfie, foto da roupa X, Y, maquiagem, tudo aquilo que define socialmente uma mulher **bonita**.

Primeiro pensei que eu podia estar com inveja, porque afinal, eu não sou bonita, me sentiria ridícula fazendo exibição do meu corpo. Mas olhando bem fundo mesmo, não consegui achar inveja em mim, porque (1) já faz tempo que me conformei de não ser bonita e (2) eu poderia me esforçar pra ser, mas não tou a fim.

Me fiz a pergunta: do que eu abriria mão pra ser bonita / padrão? A resposta é NADA.

Depois percebi o que me incomoda: a enorme importância que essas mulheres dão pra própria aparência, transformando rede social em desfile de moda, me lembra da síndrome de Estocolmo. A quem interessa mulheres gastando tanta energia, tempo e dinheiro em ser bonitas-magras-jovens-perfeitas?

Por que perpetuamos esse ciclo vicioso de colocar todo nosso valor concentrado numa carcaça?

É gritante a diferença entre homens e mulheres nesse quesito. Reparem o quanto achamos ridículos os homens que se exibem fisicamente — e é mesmo ridículo — mas achamos normal mulheres fazerem essa exibição, porque afinal estamos aqui pra embelezar o mundo, né não?

(Não)

Ah, eu sei que sempre vai ter alguém defendendo a exibição da aparência como reforço de autoestima, como “empoderamento”. Pra esse time, eu sugiro pensar sobre porque sempre a autoestima da mulher passa pela sua aparência. Por que precisamos nos sentir bonitas pra nos sentirmos felizes e dignas de afeto e interesse?

E quem é inevitavelmente feia, velha, deficiente, faz o quê pra ter autoestima? Modifica as regras do que é ser bonita pra encontrar valor em si mesma?

Faz muito mais sentido pra mim BOICOTAR, eliminar essa variável. Ao invés de dizer que “somos todas bonitas” (não somos! Beleza SEMPRE tem padrão) vamos parar de valorizar beleza como medida de qualquer coisa.

Nós não somos nosso corpo. Nosso corpo é um veículo, instrumento — carcaça.

Valorizar tanto a aparência me parece tão ridículo e fútil quanto valorizar um carro, um avião, uma bicicleta, um submarino. São instrumentos interessantes, fascinantes, úteis, mas são muito mais valorosos pelo que fazem e não por como parecem.

Um dia serei transumana e pretendo escolher uma carcaça bem cheia de “features”, combinando com minha personalidade.

Meu sonho é um mundo em que as mulheres saibam e apreciem que sua aparência não é sua característica mais importante.

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