Outro dia o Otto estava deitando na cama de manhã comigo, abraçado e bem pertinho, e ficou olhando fixamente pro meu lábio superior. Colocou a mão e disse “olha, você tem pêlos! Tipo um ‘bigodinho’!”.
Eu, sem nem pensar, me incomodei e disse “ah, tá comprido? Vou tirar depois!”. Mesmo tendo muito pouco pêlo, quase imperceptível, fiquei me sentindo toda errada.
Ele, horrorizado: “mas por que você vai tirar? O pêlo é grudado no seu poro!!!”
😬🤣
Quando ele mesmo me deu a lição que eu devia ter dado, aproveitei e mostrei meu braço (que tem menos pêlos que o dele, até) — “verdade, Otto. Todo mundo tem pêlos né? Alguns mais, outros menos, em lugares diferentes. E pessoas adultas têm mais pêlos mesmo.”
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Ontem eu olhei a perna do Fer, peluda, e lembrei da minha. Bem menos peluda, mas a dele eu acho perfeitamente ok, a minha eu acho um horror com pêlos. Não tem absolutamente nenhuma lógica. Fiquei pensando como eu acharia estranho um homem sem pêlos na perna, assim como acho estranho mulheres com pêlos. É um conceito arbitrário, super entranhado na gente, e perpetuado pela pressão social.
Será que meu filho, vendo que eu tenho pêlos (inclusive não depilo mais axila nem virilha; panturrilha não consigo deixar) terá menos encanação com pêlos em mulheres?
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Hoje no mercado vi um daqueles estandes de revista “femininas”. Celebridades e modelos magras, brancas, como pano de fundo para dicas de dieta, exercício, e casamento.
E fofocas sobre celebridades, que são elogiadas por serem magras ou execradas por serem pessoas normais, como nós.
Como não ter ódio de si mesma, e do seu corpo perfeitamente normal, com esse massacre de exemplos de maravilhosidade que não se parecem conosco nem no nosso melhor dia?
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Por isso não quero amar meu corpo, não quero me convencer de que “sou linda do jeito que sou”.
Quero que meu corpo seja irrelevante como objeto de admiração e desejo. Que meu corpo seja minha nave, meu invólucro, minha armadura, que me leva e traz, que me dá prazer e conforto, que me conecta com o mundo exterior e seus habitantes.
Uma interface, a mais complexa e louca, uma máquina de sensações, com poder de viajar pelo mundo.