Tou achando super interessante ver gente reclamando que o próprio autor da música tenha decidido que a música ficou datada e prefere não cantar mais.
Já pensou se o Monteiro Lobato — que o diabo o tenha — pudesse e quisesse revisar as imbecilidades racistas que escreveu na obra do Sítio do Pica-Pau Amarelo?
Vivemos numa época maravilhosa em que podemos ver e viver a mudança da mentalidade de artistas ainda vivos. Nós mesmos, que estamos a fim de evoluir, pudemos ver a mudança acontecer em nós. Eu mudei MUITO em 30 anos, em 20, em 10. Tenho orgulho e pretendo mudar enquanto estiver aqui. Não tem nada errado em rever algo que fez ou escreveu no passado e que hoje não faz mais sentido.
Eu vi uma cavalgadura (homem, claro) que não lembro quem é dizendo que o feminismo também é sobre liberdade de ser aquela coitada de “Com açúcar, com afeto” (música que aliás adoro). Só sendo homem mesmo pra achar que acolher macho escroto é escolha.
Vocês todes que acham que Chico Buarque (ou outros do link) “cederam por medo de cancelamento”, falem por vocês, eles já se manifestaram. Não acho que eles precisem da sua opinião pra decidir o que fazem com a própria obra. Revisitar a obra é prerrogativa do artista, venha de onde vier a “inspiração” pra fazer isso.
E afinal nada impede alguém de ouvir Amélia é que era mulher de verdade, ou Loira Burra, ou de ter saudade dos BONS TEMPOS em que ninguém achava esquisito romantizar relacionamentos de merda, misoginia ou racismo.
Acho um privilégio poder ver artistas revendo sua obra, e mudando junto com o mundo. Chico Buarque não cancelou nada, a música tá lá, lindíssima, representando outra época, e ele só percebeu que pra essa época ela não serve mais tão bem.
A visionária Elis cantou lá na década de 70, e ainda tá valendo: o passado é uma roupa que não nos serve mais. Amém.